quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Atribuições do Conselho Tutelar

O artigo 136 do Estatuto da Criança e do Adolescente enumera as atribuições do Conselho Tutelar. São funções de caráter administrativo e sócio-assistenciais, não se impregnando de juridicidade, conquanto o órgão deva se ater ao princípio da legalidade.
Passo aqui a analisar as inúmeras atribuições dispostas no art. 136 do ECA:

I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII;
Trata-se da competência para aplicação de medidas protetivas à crianças e adolescentes quando ocorrer violação por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável e em razão da conduta da criança ou do adolescente (art. 98, ECA). No caso de ato infracional praticado por adolescente, a competência para aplicação de medida sócio-educativa é do Juízo da Infância e da Juventude (148, I, ECA), ao passo que em se tratando de ato infracional cometido por criança, caberão apenas medidas protetivas, a cargo do Conselho Tutelar (art. 105, ECA). O Conselho Tutelar poderá aplicar as seguintes medidas, sem prejuízo de outras (art. 101, ECA): I. encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II. orientação, apoio e acompanhamento temporários; III. matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento de ensino fundamental;IV. inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança ou adolescente; V. requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI. inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento à alcoólatras e toxicômanos; e VII. abrigo em entidade.
II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I a VII;
Tais medidas são: I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família; II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico; IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação; V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento escolar; VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado; VII – advertência.
Aqui, "a atribuição do Conselho Tutelar é de realizar um trabalho educativo de atendimento, ajuda e aconselhamento aos pais ou responsável, a fim de superarem as dificuldades materiais, morais e psicológicas em que eles se encontram, de forma a propiciar um ambiente saudável para as crianças e os adolescentes que devem permanecer com eles, tendo em vista ser justamente em companhia dos pais ou responsável que terão condições de se desenvolver de forma mais completa e harmoniosa".
III - promover a execução de suas decisões, podendo para tanto:
a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança;
b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento injustificado de suas deliberações;
IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente;
"O Conselho, de posse de informações da existência de infrações administrativa ou penal contra os direitos da criança e do adolescente, deve dar ciência do fato ao Ministério Público, para que sejam tomadas as providências cabíveis".
V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência;
Os artigos 148 e 149 do ECA dispõem sobre a competência da Justiça da Infância e da Juventude. No exercício de suas funções, os conselheiros tutelares se deparam com situações que fogem de sua alçada, notadamente quando se percebe o caráter litigioso do problema. Situação comum é da criança que não tem registro de nascimento. O Conselho resolve outras questões de sua competência, como a aplicação de medida protetiva, e encaminha o caso ao Juízo competente para que, por meio do procedimento adequado, determine a lavratura do assento.
VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional;
O dispositivo contempla a aplicação de medida protetiva, pelo Conselho Tutelar, aos adolescentes autores de ato infracional, porventura encaminhados pelo Juízo da Infância e da Juventude. As medidas são: I. encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II. orientação, apoio e acompanhamento temporários; III. matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento de ensino fundamental; IV. inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança ou adolescente; V. requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI. inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento à alcoólatras e toxicômanos.
VII - expedir notificações;
Eis uma poderosa ferramenta de que dispõe o Conselho Tutelar para bem exercer suas funções. Evidente que, para atendimento dos inúmeros casos que lhe são apresentados, deverá convocar pais, adolescentes, servidores públicos, responsáveis por entidades. Poderá notificá-los a comparecer em sua sede, bem ainda a adotar providências para efetivação de direitos de crianças e adolescentes ou mesmo para cessar violação a tais direitos. A notificação também poderá ser utilizada para cientificar os destinatários e beneficiários das medidas aplicadas. Pode-se notificar o diretor de escola acerca da determinação de matrícula de criança ou os pais dessa criança para que cumpram a medida aplicada, zelando pela freqüência do filho à escola.
Observam Wilson Donizeti Liberati e Públio Caio Bessa Cyrino que "a notificação poderá ser feita de maneira muito simples, em forma de correspondência oficial, em impresso próprio, com o timbre do Conselho, desde que contenha, claramente, o objetivo a ser atendido".
Roberto Elias, por seu turno, assevera: "A expedição de notificações, ao que nos parece, deve ser não só com relação aos pais e responsáveis, para que apresentem seus filhos ou tutelados para serem ouvidos, mas, também, em certos casos, às entidades que atendem menores, na cobrança de alguma providência com respeito a menores, por força de medidas que foram aplicadas. Percebe-se, claramente, que o legislador quis dar ao Conselho forças para que realmente possa atuar em prol da criança e do adolescente. Cabe aos seus membros, com sabedoria, utilizar aquilo que lhes confere o Estatuto, sem em proveito único do menor, sujeito prevalecente de direitos".
VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando necessário;
O Conselho Tutelar pode requisitar dos cartórios de registro civil das pessoas naturais certidões de nascimento e de óbito, que deverão ser fornecidas gratuitamente, em qualquer hipótese. Trata-se de medida adequada para corrigir a falta do documento, situação mais comum do que possa parecer. Inúmeras crianças e adolescentes encontram dificuldades para o exercício de direitos básicos apenas porque não ostentam a certidão de nascimento e, na maioria das vezes, seus responsáveis não têm condições de pagar pela segunda via ou de ir até o cartório de origem, muitas vezes em municípios distantes daqueles em que residem. Mesmo com as facilidades da vida moderna, a atuação do Conselho Tutelar, nesse ponto, supre a falta do documento para crianças e adolescentes de famílias simples e desprovidas de recursos.
IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente;
Essa atribuição evidencia a relevância do Conselho Tutelar no que concerne às políticas públicas voltadas aos interesses de crianças e adolescentes. Afinal, saindo os conselheiros tutelares do seio da comunidade, eles bem saberão as necessidades locais e reúnem condições para sugerir as prioridades e definir os programas que melhor atendam os anseios e problemas de seu meio.
Compete ao Poder Executivo municipal propor o orçamento e submetê-lo à Câmara de Vereadores, obrigatoriamente prevendo recursos para "planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente" e, segundo Edson Seda, "para essa propositura, o Executivo deve se assessorar dos Conselhos Tutelares, os quais, recebendo reclamações e denúncias sobre a não-oferta ou a oferta irregular de serviços públicos obrigatórios, tem condições de informar ao Executivo onde o desvio entre os fatos e a norma vem ocorrendo com freqüência".
X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal;
O artigo 220 da Constituição Federal dispõe que "a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição". E no parágrafo 3º desse mesmo artigo, fixa a competência de lei federal para "estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente" (inc. II).
O Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 74, estabelece: "O Poder Público, através do órgão competente, regulará as diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada".
XI - representar ao Ministério Público, para efeito das ações de perda ou suspensão do pátrio poder.
Enquanto menores, os filhos estão sujeitos ao poder familiar (art. 1630, Código Civil). Cabe a suspensão desse poder se o pai ou a mãe abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos (art. 1637, CC), se qualquer deles for condenado por sentença irrecorrível por crime, à pena superior a 2 anos de prisão (art. 1637, par. ún., CC). A reiteração nessas faltas poderá ocasionar a perda do poder familiar, o mesmo ocorrendo se o pai ou mãe castigarem imoderadamente ou deixar o filho em abandono e praticarem atos contrários à moral e aos bons costumes (art. 1638, CC). Também importa na perda ou suspensão do poder familiar o descumprimento injustificado dos deveres de sustento, guarda e educação dos filhos menores (art. 24, ECA).
Dos abusos cometidos pelos pais contra os filhos menores, o Conselho Tutelar geralmente é a primeira instituição a tomar conhecimento. Além das providências de seu cargo (aplicação de medidas protetivas, tratamento, abrigamento etc), deverá, em sendo o caso, remeter relatório circunstanciado ao Ministério Público, que detém competência para requerer judicialmente a suspensão ou perda do poder familiar (arts. 155 e 201, III, ECA).
O art. 95 do Estatuto da Criança e do Adolescente confere ao Conselho Tutelar competência (concorrente com o Poder Judiciário e Ministério Público) para fiscalizar entidades governamentais e não-governamentais responsáveis pela execução de programas de proteção e sócio-educativos destinados a crianças e adolescentes, em regime de orientação e apoio sócio-familiar, apoio sócio-educativo em meio aberto, colocação familiar, abrigo, liberdade assistida, semi-liberdade e internação (cf. art. 90, ECA).
Para o exercício dessa atribuição, o Estatuto determina que o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente comunique o Conselho Tutelar sobre as entidades registradas e eventuais alterações (art. 90, par. ún.).
Verificando irregularidades, o Conselho Tutelar deverá representar à autoridade judiciária, nos termos do art. 191, para apuração dos fatos e imposição de penalidade.
É sempre oportuno lembrar, com arrimo em Wanderlino Nogueira Neto, que "[...] os Conselhos Tutelares podem e devem fazer o que o Estatuto e a lei municipal de criação autorizarem. Não podem agir segundo o desejo dos seus integrantes ou dos demais operadores do sistema de garantia de direitos. E, principalmente, não podem atuar para suprir ausências, faltas, omissões de outros órgãos, como por exemplo de Vara do Poder Judicial, de Órgão do Ministério Público, de Delegacia de Polícia, de Secretaria Municipal de Ação Social, de Entidades governamentais e não governamentais de proteção especial ou de socioeducação etc".
Pertinente, sobre o tema, explicação de Wilson Donizeti Liberati e Públio Caio Bessa Cyrino: "A fiscalização realizada pelos membros do Conselho Tutelar não poderá limitar-se à simples verificação da pedagogia do atendimento. Deverá, também, ser observadas a parte física do estabelecimento, suas repartições, as condições de higiene e de saúde. Isso se torna imprescindível quando se trata de entidade de atendimento que adote o regime de abrigo ou internação.